Nº 1.025 — 27/12/18
UMA TESE AUDACIOSA
O ano de 2018 termina e 2019 começa ainda sob influência das
maiores incertezas que já se abateram sobre o futuro da indústria
automobilística mundial.
Não existem dúvidas em relação à importância dos
quatro temas principais repetidos a toda hora: eletrificação, conectividade,
direção autônoma e compartilhamento. Cada um deles, porém, tem seus próprios
desafios.
Grandes grupos de fabricantes ao redor do planeta apresentam
uma visão algo mais ou algo menos corajosa sobre esses temas. Eles surgiram
quase ao mesmo tempo, muitas vezes influenciados por decisões políticas ou
estímulos de governos.
Torna-se preocupante e pode levar a um rumo perigoso a
gigantesca exigência de capital para investimento. Haverá dinheiro suficiente
para desenvolver simultaneamente quatro frentes? Conectividade e direção
autônoma apresentam alguma interatividade. As outras duas, menos.
Compartilhamento é um campo em que colaboração e parceria
podem conter gastos. Agora mesmo, arquirrivais como BMW e Mercedes-Benz
anunciaram a aprovação de autoridades americanas e europeias para um plano de
juntar forças numa única empresa em cinco iniciativas: mobilidade multimodal sob
demanda; compartilhamento de veículos em cidades; serviços de carona em autos
particulares ou táxis por aplicativos; estacionamentos conectados para agilizar
o uso, diminuindo o tempo de procura por vagas; construção de uma rede
integrada de recarrega de baterias.
Tudo isso parece insuficiente para resolver todos os desafios.
Continua a falta de consenso e mesmo convergência tecnológica sobre como mover e
abastecer ou recarregar carros elétricos. O automóvel em si não apresenta
segredos.
Pode ser até mais barato projetá-los e fabricá-los. Mas a reciclagem
de baterias ainda é um sério problema em aberto. Veículos autônomos podem
receber propulsão clássica ou elétrica, embora os custos ainda se mostrem
estratosféricos.
Nos EUA, segundo maior mercado do mundo e mais rico do que
qualquer outro, as estratégias de curto e médio prazo diferem entre GM, Ford e
FCA. A primeira decidiu apostar todas as fichas apenas em elétricos puros,
descartando híbridos e desacelerando o mais rápido possível investimentos em
motores a combustão.
Ford e FCA agem de modo cauteloso, sendo que a FCA só este
ano anunciou um plano de médio prazo focado em transição conservadora.
Para inflamar as discussões, Jack Baruth, colaborador da
revista americana Road & Track, escreveu instigante artigo sobre táticas
empresariais ligadas ao futuro. Ele defende não aplicar nenhum centavo nessas
novas tecnologias até aparecer uma solução real e prática.
Preconiza, ao
contrário, despejar dinheiro para melhorar muito os carros e motores convencionais,
o que daria grande vantagem competitiva nos próximos anos. E quando chegar a
hora de mudar, não serão dois ou três anos de atraso que farão diferença.
Para Baruth, qualquer bateria ou novos avanços em
motopropulsão até 2025 não seriam disruptivos o suficiente para agitar o
mercado de verdade e, de forma rápida, tornar-se universal.
“Então por que
gastar agora bilhões de dólares em busca do ‘Santo Graal’ se, mais adiante, a
tecnologia pode ser comprada quando começar a cair de preço?”
Trata-se de tese audaciosa.
As coisas podem não acontecer de
modo tão simples porque há pressões políticas envolvendo aspectos do meio
ambiente e utilização de automóveis nos grandes centros urbanos.
Embora possa
se aplicar aos EUA e, curiosamente, também aos países em desenvolvimento (como
o Brasil), esperar para ver passa longe de ser ideia descartável.
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fernando@calmon.jor.br
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