Coluna Fernando Calmon
Nº 1.131 — 5/1/21
DÚVIDAS E ESPERANÇAS PARA
SEGURANÇA VIÁRIA EM 2021
O que esperar do
trânsito brasileiro, em 2021, considerando que a partir de abril próximo as
mudanças no Código de Trânsito Brasileiro passam a vigorar? Afinal, a frota real
circulante no País é de 47 milhões de veículos leves e pesados, mais 13 milhões
de motos. Temos cerca de um milhão de quilômetros de estradas federais,
estaduais e municipais, das quais apenas cerca de 20% pavimentadas. Algo
surreal para um país que se diz “rodoviarista”.
Para isso conversei
com J. Pedro Corrêa, um dos mais respeitados consultores em programas de
trânsito. Ele montou um questionário e enviou a 19 pessoas de setores
diferentes ligados ao tema para sentir suas expectativas sobre este ano.
Ao analisar as
respostas concluiu que há razões para se acreditar em alguns progressos, como
há também no sentido contrário. A economia deve crescer e vir acompanhada de
aumento de tráfego tanto nos centros urbanos quanto nas rodovias, e isto provocará
aumento de acidentes. Não vê razão, porém, para pessimismo.
“É correto esperar que
em algumas cidades, principalmente capitais, ocorram melhorias. Elas poderão
contar com o suporte de organizações internacionais como a Iniciativa
Bloomberg, a WRI, a GRSP que já mostraram seu valor. Há, ainda, o Programa Vida
no Trânsito, incentivado pelo Ministério da Saúde, que tem conseguido bons
resultados em algumas capitais”, comenta.
O caso de Fortaleza provocou
ótimas reações e serve bem como modelo de programa municipal que pode se adotar
em outras cidades. Corrêa afirma que “a capital cearense deu uma lição: fora a
consultoria internacional da Bloomberg, quase tudo foi feito por lá. Um esforço
local, sem depender de Brasília, confirmando a ideia de que se a cidade mostrar
interesse e determinação em fazer as coisas acontecerem, elas acontecem”.
Ele também vê
crescimento da mobilidade ativa, notadamente o uso de bicicletas que mostrou
bom desempenho durante a pandemia e promete continuar. “Algumas cidades expandiram
suas malhas cicloviárias. Já a caminhabilidade, embora em debate público, não
teve o mesmo resultado obtido pelas bikes. São vários os subtemas, de soluções
complexas, incluindo construção e recuperação de calçadas.”
As motos continuam a
preocupar. “Fatalidades não param de crescer. O programa Motofretista Seguro, do Detran-São
Paulo, parece ser a resposta mais efetiva para o problema. Regularização da
CNH, capacitação e formação, facilidade na compra de itens de segurança (e da
própria moto) e acesso a linhas especiais de crédito junto ao Banco do
Povo Paulista foram boas respostas.”
Há ainda uma incógnita para 2021. O Plano Nacional de Redução de Mortes e
Lesões no Trânsito, criado pelo Denatran em 2018, até agora não decolou de vez.
Corrêa mostra cautela. “Se executado com êxito, nossa agência-líder assumiria a
efetiva coordenação das ações preconizadas pela ONU/OMS para a 2ª Década
Mundial de Trânsito. Na 1ª Década, alcançamos 30% de uma meta de 50% de redução
do número de mortes, algo até aceitável. Sinto a equipe do Denatran bem
motivada, mas é preciso muito mais que isto – sem recursos adequados, não há
como realizar bons programas.”
Ele aponta também uma conquista de grande importância possível para 2021.
A continuação do Programa Brasileiro de Avaliação Viária, comandado pelo DNIT (Departamento
Nacional de Infraestrutura de Transportes) e desenvolvido por uma organização
internacional, com objetivo de recuperar a malha rodoviária federal brasileira.
“O exame de 65.000 km de rede pavimentada e a classificação por estrelas começarão
em breve. O Laboratório de Transportes e Logísticas da Universidade Federal de
Santa Catarina atua como Centro de Excelência do iRAP no Brasil, desde 2015. O
iRAP (sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Estradas) é
uma organização não governamental com atuação em mais de 100 países. Classificação
por estrelas e recuperação das rodovias federais é fato do maior significado
para a segurança viária brasileira”.
Corrêa é um entusiasta do programa sueco Visão Zero (para mortes no
trânsito). “O Governo Federal pode dar uma contribuição extraordinária, se usar
adequadamente o convênio de cooperação assinado com a embaixada da Suécia. Os conceitos,
desde os anos 1990, são aplicados por dezenas de outros países. Especialistas
suecos poderiam desenvolver um modelo de treinamento gerencial para técnicos
brasileiros na área de gestão de programas. Este é um dos principais problemas
nacionais. Importante, em 2021, seria adaptar os conceitos, respeitando características
e valores nossos.”
O consultor termina, afirmando: “Dá para entender porque meus
entrevistados mostram dúvidas e esperanças em relação à circulação viária em
2021. São como nuvens densas cobrindo o país nesta área: podem anunciar as
chuvas que faltaram este ano em várias regiões, mas que podem, ao mesmo tempo,
aumentar os problemas que já tínhamos. O tempo dirá.”
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www.fernandocalmon.com.br
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