Fernando Calmon
Nº 1.097 — 14/5/20
INDÚSTRIA TEM MAIOR
TOMBO DA HISTÓRIA
A situação da indústria automobilística é uma das mais
difíceis entre todos os setores da economia brasileira. A paralisação em abril de
63 das 65 empresas instaladas aqui (incluindo tratores e máquinas rodoviárias)
levou a números incrivelmente baixos: apenas 1.847 veículos leves e pesados produzidos.
Um número próximo a fevereiro de 1957 (63 anos atrás) quando o parque produtor
mal tinha sido montado e contava apenas com sete fabricantes: Vemag (DKW), FNM,
Ford, GM, Mercedes-Benz, Scania e Willys. Havia ainda a Romi (Isetta), fora dos
números da Anfavea, por não ser filiada.
Enquanto a produção caiu 99%, os emplacamentos de automóveis
e comerciais leves (picapes e furgões) novos registraram apenas 55,7 mil
unidades ou 77% inferiores a abril de 2019. Os números reais, no entanto, são
um pouco melhores em razão das vendas feitas via internet.
Como os carros não
puderam ser emplacados pelo fechamento de quase todos os Detrans em razão da
pandemia de Covid-19, ficaram excluídos das estatísticas, embora possam
circular portando apenas a nota fiscal de compra.
Alguns analistas estimam que as vendas reais possam ter sido
até 40% maiores ou 70.000 unidades no mês passado. Este fenômeno está
acontecendo também em maio e quando os emplacamentos forem regularizados haverá
um crescimento artificial ao computar as vendas represadas.
Os estoques totais em fábricas e concessionárias passaram de
35 dias para 128 dias (mais de quatro meses) e haverá dificuldade em escoá-los
porque deve haver um desbalanceamento do mix de produtos já fabricados. Com
menos dinheiro no bolso talvez quem comprava as versões de topo, prefira as
intermediárias e entre estes alguns talvez optem pelas básicas.
Nos depressivos anos de 1980, o Monza, um modelo médio, foi por
três vezes seguidas o mais vendido no País. A explicação: grande parte dos compradores
perdeu poder aquisitivo e se retirou do mercado.
Atualmente, com muitas opções
de modelos pequenos, inclusive SUVs compactos, os financiamentos e as ofertas,
aquele fenômeno não deve se repetir. A procura por seminovos certamente
aumentará e versões de entrada atrairiam mais apenas na base da pirâmide de
vendas.
A indústria e as concessionárias enfrentam os mesmos problemas
de falta de liquidez e prejuízos se acumulam. As concessionárias estão sufocadas
e pedem abertura para vendas presenciais com os devidos cuidados de
higienização (oficinas estão abertas, com pouca procura).
A Anfavea reconhece
como necessário o rodízio ampliado na cidade de São Paulo que retira de
circulação diária 50% da frota (com algumas exceções). Iniciado no último dia
11, vai até 31 de maio.
Essa decisão da prefeitura da maior cidade do País, que
responde por 20% de todas as vendas de carros, apresenta prós e contras. A
ideia é estimular a utilização do transporte coletivo, onde existe grande
aglomeração de pessoas, mas todas são obrigadas a usar máscaras. São Paulo
acumula o maior número de casos e de mortes pela pandemia.
A alternativa,
segundo a prefeitura, seria o lockdown,
isolamento em grau máximo, com consequências ainda maiores nas atividades
econômicas.
A Anfavea subiu o tom em relação à crise política que assola
o Brasil, relacionando-a à disparada da cotação do dólar frente ao real. Isso
vai impactar nos preços dos veículos, pois na média 40% dos custos são
dolarizados e em alguns modelos recentes até mais.
DIFERENTES
ESTRATÉGIAS
Todos os fabricantes de veículos estão empenhados em criar
estratégias para enfrentar seus pátios lotados e também os das concessionárias.
Será uma verdadeira guerra de promoções e ofertas, tendo ao mesmo tempo de
lidar com o inevitável aumento de preços.
A condição mais oferecida é adiar ao
máximo o vencimento das primeiras parcelas de financiamento, em alguns casos
até janeiro de 2021. Quem der uma entrada de 50%, fica isento das sete primeiras
prestações (caso da Jeep) ou pagar amortizações simbólicas iniciais de R$ 99 (caso
da VW).
A Hyundai começou a vender o SUV Creta para locadora pela
primeira vez. Antes só o HB20 era oferecido como meio de escoar a produção com
grandes descontos. A Ford criou um serviço de desinfecção veicular inédito para
modelos de sua marca por preço acessível (R$ 129).
Espera-se que bônus na compra de um modelo novo e supervalorização
do usado na troca transformem-se em regra geral.
Já a GM abrirá, na segunda quinzena de maio, a primeira loja
virtual em parceria com o Mercado Livre focada no novo Tracker. Todo o processo
de compra será digital, envolverá suas 546 concessionárias e até entrega do
veículo na casa do comprador neste período de distanciamento social.
Enfrentar o segundo trimestre será um desafio enorme. Apenas
em junho surgiria um alívio nas restrições ao comércio tradicional, dependendo
da decisão de cada estado e município. Mesmo com ajuda da internet, não adianta
produzir, sem ter para quem vender. Até lá, ficar em casa é a alternativa
correta.
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