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domingo, 10 de agosto de 2014

PORSCHE 911T, 1971, UM CARRO QUE FEZ ÉPOCA. O NOSSO COLUNISTA DE ANTIGOMOBILISMO FALA HOJE SOBRE ESSE BÓLIDO QUE SEU PAI TINHA NA COLEÇÃO, E QUE QUASE O DEIXOU NO ASFALTO QUANDO A PORTA SE ABRIU E RICARDO CAFFERELLI, POR UM TRIZ, NÃO CAIU NA ESTRADA. ESSE PORSCHE VERMELHO CHEGOU A PARTICIPAR DE NOVELAS DA TV GLOBO E FOI VENDIDO, DEPOIS DE RESTAURADO. QUANDO O NOVO DONO O ESTAVA LEVANDO PARA CASA, O PORSCHE PEGOU FOGO, MAS UM MOTORISTA DE ÔNIBUS CONSEGUIU APAGAR O FOGO E ELE SEGUIU VIAGEM ATÉ SEU DESTINO: UBATUBA. CAFFARELLI TEM ALGUMAS PEÇAS DO CARRO DISPONÍVEIS.




Porsche 911 T

Quase me deixou literalmente no asfalto


Ricardo Caffarelli

Caros leitores e amigos, em meu último artigo escrevi sobre o sueco Volvo 740 D, um sedan com estilo bem “quadradão”, um verdadeiro guerreiro, que até uma enchente enfrentou. 




Lembrei-me de boas e engraçadas histórias vividas com um dos maiores mitos da indústria automobilística alemã, o Porsche 911 para escrever a crônica de hoje.

Numa época em que meu pai estava adquirindo automóveis com muito ímpeto e sem muito critério, apareceu lá no Rio de Janeiro uma suposta oportunidade. Um Porsche 911 T. 


Um sonho de consumo atemporal. Estava nas mãos de um professor da UFRJ de nacionalidade francesa que ia voltar para França e tinha de vender o carro. 

Recordo-me que esse rapaz passou na Joá Automóveis, loja que ficava bem próximo à nossa casa, que não se interessou em comprar ou consignar o Porsche e nos avisou da chegada do carro.



Nos ligaram e fomos correndo ver o “bólido”. Fui dar uma volta. Estava um calor muito forte. O carro não tinha ar condicionado e o francês fedia muito.... imaginem a situação.

Não tínhamos muita experiência com Porsche e quando fui dirigir estranhei muito o fato do carro ser muito “manual”. 


Sem servo-freio, sem direção hidráulica, sem quase nada, a não ser um teto solar e vidros elétricos. 

Talvez estivesse muito mal acostumado com o conforto e os “gadgets” dos esportivos americanos.

Quando fui engatar as marchas, achei mais estranho ainda que o curso da alavanca era muito, curto. 


O francês logo disse que era um limitador de curso da alavanca que ele tinha instalado, pois o curso normal era muito longo e assim ficava mais gostoso dirigir.

Eu achei meio esquisito. 
Nunca tinha ouvido falar.
Bem, o carro era 1971 mas a aparência era de 1974. Mais uma vez perguntei e me disse que essa modificação era um kit, muito vendido na época. 


Como o Porsche realmente teve uma alteração significativa no seu design, alguns proprietários usaram este artifício para deixar seu carro mais “atual”.

Avaliados prós e contras achamos que o preço negociado estava convidativo. Sim, o carro precisava de alguns reparos mas achávamos que conseguiríamos no futuro revendê-lo com algum lucro, embora não fôssemos comerciantes de automóveis e sim colecionadores.

Sendo assim no mesmo dia lá estava eu passeando com um nada discreto Porsche pelo Rio de Janeiro. Alguns amigos vieram conhecer a nova aquisição. 


Um deles o Fernando, apaixonado por Porsche desde criancinha, sentou ao volante e foi direto com a mão esquerda na chave de ignição. Nada com um bom entendedor. 

Essa “marca registrada” da Porsche teve origem nas corridas numa época em que a largada era a pé!

Isso mesmo, os pilotos saiam correndo a pé, entravam nos carros, davam partida e largavam. 



Os engenheiros da Porsche tiveram essa sacada de que ao usar a mão esquerda para ligar o carro, a direita estaria livre para já engrenar a marcha e ganhar alguns milésimos de segundos o que como sabemos hoje, podem definir uma corrida.

Levamos o carro para uma oficina em Petrópolis do “mão branca” onde usávamos muito os excelentes serviços de lanternagem e pintura. 


Queríamos apenas dar uma revitalizada no carro. Foi lá que tivemos a primeira decepção. O câmbio não era de Porsche e sim de Kombi. 

Acredite se quiser, alguém, possivelmente de nacionalidade francesa, mandou adaptar um câmbio de quatro marchas de Kombi pois provavelmente o original havia quebrado. Que chato!

Funcionava, mas é claro que o carro perdia desempenho até porque o câmbio original tinha cinco marchas. 




Somava-se ainda o fato de os seis carburadores, dois webber triplos, um de cada lado, estavam mal regulados.

Cabe comentar que este carro possuía um motor boxer seis cilindros de 2.195 cc e potência de 125 CV, o que não era tanto assim frente ao peso do carro.

Descemos a serra 
com o carro, quando comprovei a famosa estabilidade do Porsche. Com uma boa distribuição de peso, o carro realmente surpreendia pela leveza ao dirigir. Andar forte mesmo eu não consegui.

Passado um tempo, cheguei alugá-lo para algumas novelas. Uma delas eu me recordo que tive que declinar. 


Tratava-se da novela das 19h, da Tv Globo, chamada “Quatro por Quatro” em que a cena no primeiro capítulo era exatamente um acidente envolvendo quatro carros e eles queriam um carro vermelho que seria colidido por trás. Logo o Porsche que tem motor traseiro? Eu disse que não. Coitado do carro...

Conversando com colegas do Veteran Car Club do Rio de Janeiro indicaram-me uma oficina que sabia trabalhar com a regulagem desses carburadores. 


Deixei o carro lá, fui acompanhar e autorizamos o conserto que foi feito a contento, o único descontentamento é que na correria em que vivíamos eu não tive tempo de buscar o carro de volta e ele ficou lá uns dois meses até conseguir ir pegá-lo. 

A oficina não era muito grande e o dono teve que deixar o Porsche sob sol e chuva. Quando fui buscá-lo percebi que essa temporada lá não fez muito bem ao carro, o assoalho tinha ficado todo podre com água empossada.

Tirando isso, o carro pegou, realmente ficou com a marcha lenta mais regular e a aceleração melhorou muito. 




Isso me empolgou um pouco a fazer um solitário track-day pelas curvas sinuosas da estrada do alto da boa vista, local onde nas décadas de 60 e 70 funcionava um verdadeiro autódromo a céu aberto, ou melhor, um autódromo sem fronteiras, sem lei seca, sem blitzen...

Subindo da Usina em direção ao Alto, resolvi pegar um atalho numa curva fechada à direita e eis que ao apoiar o peso do meu corpo na porta a mesma abriu sozinha e eu quase caí do carro. Por isso que disse que ele quase me deixou no asfalto.

Passado o susto, quando cheguei ao topo e comecei a descer, outra surpresa. Os freios começaram a falhar.

Resultado, fim do track-day e volta para casa bem pianinho a fim de evitar acidentes.

Nesse intervalo de tempo, tínhamos vendido o carro para um colecionador de São Paulo, mas não podíamos entregar o carro assim. Meu pai que sempre foi muito correto, disse: 



“Não posso entregar um carro nessas condições, não foi assim que eu o vendi”, muito embora o comprador não tivesse visto o carro antes. Lá vai o carro de novo para oficina. Desta vez, em Niterói, nas mãos habilidosas do Fernando.

Trocamos o fundo do carro, mais uma limpeza e polimento e ele estava pronto, quer dizer quase...

O alternador tinha parado de carregar, mas como ele usava 2 baterias de 12 V na frente, ainda pegava.

Liguei para o Flávio (novo proprietário) vir buscar o carro com uma forte recomendação: “Flávio, venha de manhã, pois o carro não está carregando bateria e não é bom você viajar com ele a noite". 

- OK, respondeu ele. E só me ligou de volta quase às cinco da tarde para pegá-lo no aeroporto Santos Dumont.

Fomos direto para oficina. O carro custou a pegar... Sujeira na tubulação... espera um pouco, ar comprimido, tenta de novo. Agora sim, pegou. 


Em seguida ele olhou para o teto solar que estava fechado. Perguntou como abria, eu mostrei o botão. Nada. Ele havia emperrado. 

Não satisfeito ele pediu um pedaço de madeira e um martelo e sem dó nem piedade abriu o teto a marteladas.

Eu assisti a cena e fiquei quieto, fazer o que?

Bem, acompanhei-o um pedaço do caminho e voltei para casa. Ele ia seguir até Ubatuba. Pedi para me ligar avisar quando chegasse. 


Passou domingo e nada. Na segunda-feira, seu filho me ligou perguntando sobre ele e comecei a ficar preocupado. Nada de notícias. 

Terça-feira, Flávio me ligou dizendo que tinha chegado, mas que havia tido problemas com o carro. 

Disse com estas palavras: “Olha, você tem que mandar prender o cara que fez essa revisão no motor do carro”. 

Eu retorquei: “Porque, o que houve? Eu estava preocupado com os freios”. 

Ele disse: “Os freios acabaram logo na descida da ponte, mas até aí tudo bem porque eu fui poupando e aos poucos eles voltaram a funcionar o problema foi que o Porsche explodiu”. 

Eu não consegui segurar uma gargalhada ao telefon: “Como assim, Flávio?”.

Ele continuou contando que estava seguindo pela Rio-Santos e que na altura de Mangaratiba o carro começou a engasgar, deu um retrocesso no motor e começou a pegar fogo. 


Com certeza ao andar à noite com faróis acessos a energia das baterias foi acabando ao ponto de não conseguir mais enviar uma corrente suficiente para as velas. 

O acúmulo de gasolina nos cilindros deve ter causado "afogamento" do motor e o combustível transbordado e caído na descarga quente. 

Sua sorte foi um ônibus ter parado e o motorista ter conseguido correr com o extintor e conseguir apagar o fogo.

Fábio também não se atrapalhou, pegou um táxi, entrou na cidade mais próxima, comprou duas baterias novas e seguiu viagem, chegando a Ubatuba com a bunda do Porsche toda chamuscada.

Que aventura!

Aprendemos uma lição, Porsches não são para antigomobilistas iniciantes. Além de uma mecânica um pouco mais especializada, as peças desse carro custam uma fortuna. 


Muito mais caro que as peças da sua conterrânea Mercedes-Benz, por exemplo. Conseguem ser mais caras do que peças de Jaguar. 

Aliás, falando em peças, atenção: ficou um legado desse carro aqui comigo, tenho algumas peças novas disponíveis para venda (distribuidor, miolo completo da chave de ignição, bicos injetores, instrumento de painel conjugado, entre outras).

Os carros antigos são assim. Nos dão prazer muitas vezes, mas temos de estar preparados para surpresas a qualquer hora e precisamos ter bom humor e jogo de cintura para contornar as adversidades.

Espero que tenham gostado e até a próxima.

Um abraço.

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